Moda em rodas

Moda em rodas

Natural de Aracaju (SE), Heloisa Rocha possui uma doença rara chamada Osteogênese Imperfeita, chamada popularmente de “ossos de vidro” ou “ossos de cristal”. Além da fragilidade óssea, a jovem de 31 anos possui menos de um metro de altura, pesa menos de 20 kgs, possui inúmeras deformações no corpo por conta das fraturas já sofridas e uma escoliose severa.
Independente das suas limitações, ela é graduada em jornalismo, pós-graduada em comunicação jornalística, redatora de uma renomada rádio em São Paulo – cidade em que reside há oito anos –, fala duas línguas estrangeiras e, apesar da baixa estatura, tem uma personalidade maior que a si mesma. Há menos de dois meses, ela criou um perfil no Instagram, e, na sequência, uma página no Facebook, chamado 
@modaemrodas, no qual pretende provar que moda e deficiência andam de mãos dadas, mas que é preciso um pouco de busca, autoconhecimento e criatividade. 

Qual o motivo e desde quando você usa a cadeira de rodas? 

Possuo uma doença rara chamada Osteogênese Imperfeita, conhecida popularmente como “ossos de cristal”, e que tem como principal característica a fragilidade óssea. Por conta das inúmeras fraturas que obtive na infância e ainda na gestação, os meus membros (inferiores e superiores) são curvados e, consequentemente, fui impossibilitada de andar, assim passei a vida inteira utilizando uma cadeira de rodas como forma de locomoção.  


Moda em rodas


Heloisa, você é diferenciada pelo fato como encara a sua deficiência. Você também se vê assim?

Nunca escondi minha condição física e, muito menos, sempre tive plena consciência das minhas limitações, mas isso nunca foi um fator primordial na minha vida. Tive uma boa base educacional em casa que nunca passou a mão na minha cabeça e nunca me isentou das minhas obrigações por conta da deficiência. Dessa forma, acredito eu, que consegui formar uma imagem e personalidade que fossem além da minha condição física. Assim, ganhando um pouco de respeito pelos meios em que convivo. Sim, eu sempre me vi como “a jornalista Heloisa Rocha” e não como “a menina/mulher/garota com deficiência”.  


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Para você, como uma pessoa com deficiência deve encarar a vida?

Para mim, a pessoa com deficiência deve tentar encarar a vida normalmente, ou seja, ser honrada com seus devidos direitos e se responsabilizar por seus deveres, como qualquer outro cidadão. 
Infelizmente, a sociedade ainda não nos vê dessa forma e o rótulo de “coitadinho”, de “incapaz” ou de “super herói” está enraizado em nossa cultura. Assim, a sociedade com deficiência deveria, a meu ver, ser mais unida e lutar para que esse estigma se quebre, mas o primeiro passo para isso é tentando se valorizar mais como pessoa e colocando sua personalidade e capacidades acima da deficiência. Mas para isso é necessário que a pessoa, em si, trabalhe bem sua autoestima e não utilize a deficiência como seu escudo ou cartão de visita. A pessoa com deficiência é muito mais do que uma cadeira de rodas, uma bengala, um andador, um cão-guia, etc. 


Moda em rodas


Você esta com um projeto no Instagram chamado modaemrodas, qual o propósito do projeto?

A ideia, inicialmente, é de orientar as pessoas que, assim como eu, têm alguma dificuldade de montar um look, pois seu biotipo, no geral, não atende ao mercado. Assim, eu dou dicas de lugares onde comprei determinada peça, truques que aprendi com a vida e ajustes feitos, que são essenciais para o caimento perfeito. Por outro lado, o perfil tem ajudado algumas pessoas a entenderem que não é por que seus corpos não são iguais ao de uma modelo de uma capa de revista é que elas estão privadas de serem femininas, estilosas e de, principalmente, terem uma autoestima elevada. Tudo isso é uma questão de conhecer a si mesmo e se amar do jeito que é. Por fim, quem sabe, o perfil não atinja a um outro nível e sirva para que as empresas, indústrias, publicitários, comunicadores, 
fotógrafos e estilistas entendam que não existe um padrão único para a moda e que há uma classe com deficiência que aspira e consome moda, mas que, infelizmente, são pouco representados.

Moda e pessoa com deficiência, podem andar juntos?

Claro! Todo mundo precisa se vestir, não? (risos) Brincadeiras a parte, de acordo com o IBGE, somos 45,6 milhões de pessoas com deficiência no Brasil e não podemos ignorar essa parcela da população acreditando que precisamos apenas de rampas e elevadores para nos sentirmos incluídos. Trata-se de uma parcela muito significativa no País que consome, compra, se veste e que, assim como a moda plus size, necessita de adaptações e de representatividade. Afinal, a pessoa quando se sente bem com si mesma transmite confiança aos demais e é disso que muitos brasileiros com deficiência precisam.  


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Qual sua dica para uma pessoa com deficiência que quer ser estilosa e estar na moda?

Primeiro é conhecer o seu corpo, aceitá-lo e saber quais peças te favorecem mais. Infelizmente, somos inspiradas por celebridades e modelos que não tem um biotipo que nada nos assemelha e muitas tentam vestir peças que ficam bem em pessoas que não tem o mesmo biotipo que o nosso e, especialmente, não possui a mesma dificuldade que a nossa. Assim, muitas vezes, erramos no modo de nos vestir porque queremos ser alguém que não somos e ao nos vermos no espelho nos frustramos porque achamos que iríamos ficar iguais aos nossos ícones. Outra dica é ter uma boa costureira, pois achamos que uma peça não ficou bem em nós em razão do nosso corpo, mas, às vezes, uma questão de um simples ajuste pode ser a solução do seu guarda-roupa. Por último é montar um estilo próprio a sua personalidade, ao seu gosto, a sua idade e a sua profissão ou meio em que circula. Originalidade e personalidade são questões de lei para quem quer ser uma “it girl”. 

Existe algum tipo de problema, principalmente para os cadeirantes encontrarem roupas da moda e ao mesmo tempo confortáveis?

O universo de quem utiliza uma cadeira de rodas é muito heterogêneo e, muitas vezes, minhas dificuldades não condizem ao do próximo. Mas no quesito vestuário acredito que a dificuldade seja ao utilizar peças que o dificultem ao se vestir ou despir com independência, especialmente as calças, saias, shorts e bermudas. Além disso, em conversa com um cadeirante na última edição do Desfile de Moda Inclusiva, em São Paulo, ele me relatou que quem toca sua cadeira sozinho acaba danificando muitas camisas, casacos ou jaquetas por conta do constante atrito da peça com a roda. Por fim, não se trataria muito de roupa em si, mas a grande dificuldade que um cadeirante tem é na ausência de acesso à determinadas lojas, da dificuldade de circulação no local, da ausência de provadores para cadeirantes e do despreparo do atendente ao cliente com deficiência.  

Na sua opinião, por que não ouvimos falar com a mesma ênfase sobre os concursos de beleza para pessoas com deficiência, como para pessoas ditas como “normais”?

Porque infelizmente vivemos uma era em que cultuamos a imagem e a um padrão de beleza que não corresponde a mais da metade das mulheres do mundo. Enquanto enxergarmos a pessoa com deficiência como um ser assexuado ou que necessita apenas de rampas para se sentir incluído dificilmente ele será objeto de interesse ao mercado da moda e da beleza. Precisamos nos tornar interessantes e belos para adentrarmos neste mercado tão fechado e coberto por regras e padronizações. 

Deixe uma mensagem para nossos amigos leitores.

A deficiência é apenas uma parcela pequena daquilo que você realmente. Valorize sempre suas qualidades pessoais e os atributos físicos e psicológicos que mais te atraem e perceba que as pessoas te enxergarão com outros olhos.

Segue ai: https://www.instagram.com/modaemrodas/

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